O fim das democracias européias
Paul Belien | 08 Dezembros 2009
Artigos - Globalismo
No novo Estado, "os direitos e deveres vinculados à cidadania da União [são] superiores àqueles vinculados à cidadania nacional [i.e. provincial] em qualquer caso de conflito entre as duas, por causa da superioridade da lei da União sobre a lei nacional [i.e. provincial] e as Constituições”.
Entrou em vigor ontem [1 de dezembro de 2009] o Tratado de Lisboa, que transforma a União Européia em um Estado autônomo. Embora muitos europeus ainda não se tenham dado conta, 500 milhões deles possuem agora um governo comum ao qual os governos de seus próprios países são juridicamente subservientes. Desde ontem, os 27 Estados da UE foram reduzidos ao status de províncias. O Tratado de Lisboa, que é a carta básica (isto é, a Constituição) do novo Estado da UE estipula que os parlamentos das 27 províncias estão obrigados a "contribuir ativamente ao bom funcionamento da União." É obrigação legal dos parlamentos avançarem primordialmente os interesses da União em vez daqueles de seu próprio povo.
No início desta semana, Michel Barnier, membro francês da Comissão Européia, explicou ao jornal Le Figaro, de Paris, que "a Comissão Européia é o Primeiro Ministro da UE". Muitos europeus pensam que essa é uma metáfora, mas, infelizmente, ela deve ser levada a sério.
A Comissão Européia é, como disse Barnier, "um Primeiro Ministro coletivo que junta 27 países que estão unidos em seu destino". A Comissão é presidida por José Manuel Barroso, de Portugal. Seu título é o de "Presidente da Comissão Européia". Por enquanto, cada uma das províncias ainda possui um membro na Comissão, mas o seu número será reduzido a dois terços do número de províncias a partir de 2014. A Comissão representa a União, não as províncias. Os atuais 27 comissários são indicados por um período de cinco anos por seus respectivos governos, i.e., os governos das 27 províncias. No entanto, eles não representam esses governos e permanecem membros da comissão mesmo se o governo provincial for substituído por outro.
A Comissão é não somente o órgão executivo do novo Estado, mas também seu órgão legislativo. Não há separação de poderes na UE.
O Sr. Barroso chefia a Comissão e como tal é o rosto humano do "Primeiro Ministro coletivo".
Como as instituições precisam de um rosto, não seria errado descrevê-lo como o Primeiro Ministro da Europa.
A Baronesa britânica Cathy Ashton foi designada Ministra do Exterior do novo Estado. O título exato dela é "Alta Comissária para Assuntos Externos e Política de Segurança". Por lei, o Alto Comissário é também Vice-Presidente da Comissão. Lady Ashton é também a representante britânica na Comissão. O seu status é especial porque ela não foi designada por seu governo provincial, mas, como Alta Comissária, precisou do apoio de todos os 27 governos. Quando os ministros do exterior das 27 províncias se reúnem, ela preside as reuniões. Como o Ministro do Exterior britânico também está presente, há dois cidadãos da província britânica presentes na sala, mas em sua qualidade de Alta Comissária, Lady Ashton não representa a sua província, mas a União como um todo.
O novo Estado tem também uma pessoa a quem nós chamamos de Presidente. Herman Van Rompuy da Bélgica foi designado para essa posição. O título exato de Van Rompuy é "Presidente do Conselho Europeu". Como a Comissão é o Primeiro Ministro coletivo do novo Estado, o Conselho Europeu deve ser visto como o "Presidente coletivo" da UE. O Conselho é a entidade na qual os chefes de governo das 27 províncias se encontram. O Conselho é presidido pelo Sr. Van Rompuy. Ele foi indicado pelos governos das 27 províncias e, como Lady Ashton, precisou da aprovação de todos os 27. No entanto, ao contrário de Lady Ashton, Van Rompuy não é membro da Comissão. A província da Bélgica tem seu próprio comissário e tem também seu próprio representante no Conselho, o Primeiro Ministro da Bélgica. O Sr. Van Rompuy é só Presidente do Conselho e nada mais. Ele também representa a UE para fins de cerimonial.
Ainda não está claro se será o Primeiro Ministro da UE (i.e. a Comissão, presidida pelo Sr. Barroso) ou o Presidente da UE (i.e. o conselho, presidido pelo Sr. Van Rompuy) quem terá mais poder político no novo Estado. Isso dependerá da força que tenha o Sr. Van Rompuy como figura política e quanta influência política direta ele quererá exercer. A expectativa geral era a de que, se a presidência tivesse ido para um político conhecido, como Tony Blair, o Presidente teria em suas mãos a liderança política da UE, às custas da Comissão. O Sr. Barroso não é uma figura particularmente forte.
No entanto, não está certo que o Sr. Van Rompuy agirá para reduzir a influência da Comissão. Van Rompuy é um federalista europeu que quer limitar os poderes das províncias (os 27 Estados-membros da UE) e fortalecer os poderes centrais da União. Embora o Presidente (i.e. o Conselho, presidido por Van Rompuy) seja o órgão que representa as províncias, é provável que Van Rompuy favoreça mais poderes para a Comissão, que é o órgão central em Bruxelas. Apesar de que o Sr. Van Rompuy não é membro da Comissão, muitos o vêem como o homem da Comissão no Conselho. Ele é uma figura política mais forte do que o Sr. Barroso, mas, paradoxalmente, vai usar sua influência para fortalecer o Sr. Barroso e a Comissão às custas do Conselho que ele próprio preside.
A província de origem do Sr.Van Rompuy é a Bélgica. Essa província é ela mesma feita de nações subjugadas, a mais importante das quais é a Flandres de língua holandesa. Embora o Sr. Van Rompuy seja flamengo, seu objetivo político sempre foi o de desfazer os sentimentos de identidade flamenga e promover a belgicidade. Não há muita dúvida de que vá fazer o mesmo no plano europeu. Em entrevista recente com o semanário em holandês Elseviers (7/11), o Presidente Van Rompuy afirmou: "Eu sou um europeu [porque] a idéia européia é um antídoto contra o nacionalismo, um soro contra o Movimento Flamengo". Van Rompuy opõe-se ao nacionalismo provincial e aos movimentos que querem fortalecer o provincialismo e a identidade provincial. Ele considera esta última como o veneno que precisa de um antídoto. O novo presidente é um centralista que favorece a autoridade federal sobre a "venenosa" autoridade provincial (i.e. soberania nacional).
Além de um Presidente e de um Primeiro Ministro, o novo Estado da UE tem também um Parlamento. Este, no entanto, não possui poderes legislativos. O único poder que ele tem é o de rejeitar o orçamento anual proposto pela Comissão e vetar a indicação de membros da Comissão. Portanto, o Parlamento pode vetar a indicação do Sr. Barroso, de Lady Ashton, e de qualquer outro Comissário. Mas ele não pode vetar a indicação do Sr. Van Rompuy como Presidente da UE.
Nosso novo Estado não é uma democracia. Nem a Comissão, nem o Presidente Van Rompuy foram eleitos pelo povo. Ao ratificarem o Tratado de Lisboa, os parlamentos provinciais (ex-nacionais) democraticamente eleitos abriram mão, voluntariamente, de sua soberania, reduzindo a si mesmos a instituições provinciais e retirando de seus eleitorados o direito de decidir democraticamente sobre seu próprio futuro. Em troca dessa emasculação nacional, as 27 províncias receberam um Primeiro Ministro coletivo comum, incorporado no Sr. Barroso, e um Presidente comum, incorporado no Sr. Van Rompuy.
Se os povos da Europa desejam restaurar sua soberania e seus direitos democráticos anteriores, a única opção que lhes resta é a alta traição, i.e., deslealdade para com o Estado ao qual pertencem (a União européia), buscando a sua destruição e desmembramento.
Isso é obviamente ilegal. Como notou o Prof. Anthony Coughlan, no novo Estado "os direitos e deveres vinculados à cidadania da União [são] superiores àqueles vinculados à cidadania nacional [i.e. provincial] em qualquer caso de conflito entre as duas, por causa da superioridade da lei da União sobre a lei nacional [i.e. provincial] e as Constituições".
A primazia da União sobre as entidades provinciais, ex-nacionais, vem contra tudo o que os povos da Europa percebem como normal e natural. Como tal, ela é fundamentalmente imoral. Tendo de escolher entre a lealdade jurídica devida ao novo Estado, estabelecido ontem, e a lealdade moral devida às suas próprias províncias e à sua antiga identidade nacional, os povos da Europa estão agora diante do mesmo desafio no qual se encontram os flamengos desde sua incorporação, pela força, ao Estado da Bélgica em 1830. Alguns, como o Sr. Van Rompuy, escolherão as obrigações legais sobre as morais; outros escolherão a moralidade sobre a lei. A questão a ser indagada é a de se é legítimo um Estado que impõe tal dilema a seu povo.
Fonte: www.midiasemmascara.org/artigos/globalismo
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