Estamos nos movendo cada vez mais próximos da era de controle da mente
O interesse militar na nova tecnologia de escaneamento cerebral está começando a mostrar um lado sinistro
Por Steve Rose
Observer.guardian.co.uk
Artigo da Light eye
Os cientistas do cérebro estão enrolados. A preocupação a respeito do aumento dos níveis de angústia mental tem resultado em níveis de financiamento sem precedentes nos Estados e Europa. E uma gama de novas tecnologias, da genética a imagem cerebral, estão oferecendo extraordinários insights dos processos molecular e celular subjacentes de como nós vemos, como nos lembramos e porque nos tornamos emocionais.
A imagem cerebral se tornou familiar. Scanners, conhecidos pelas suas iniciais-CAT, PET, MRI - começaram como ferramentas clínicas, capacitando os cirurgiões a identificar potenciais tumores, os danos na sequência de um acidente vascular cerebral ou os sinais diagnósticos de uma demência em estado inicial. Mas os neurocientistas rapidamente se aperceberam de seu potencial mais amplo. As imagens de regiões do cérebro "acesas" quando uma pessoa está pensando em seu amor, imaginando viajar de casa para fazer compras ou resolvendo um problema matemático, tem capturado a imaginação dos pesquisadores e do público também. E se eles pudessem fazer mais?
Recentemente eu publiquei os resultados de uma experiência na qual nós olhávamos para as regiões do cérebro que se tornavam ativas quando as pessoas escolhiam entre produtos concorrentes nos supermercados. Grandes companhias, variando da coca-cola a BMW, estão começando a fazer imagens dos cérebros dos consumidores para estudar como eles respondem a novos designs ou marcas. Elas estão começando a falar de 'neuromarketing' e 'neuroeconomia'.
Tais tendências podem ser relativamente inócuas, mas o crescente interesse mostrado no que as imagens poderiam revelar é mais do que isso. Especificamente, e se a imagem cerebral pudesse revelar o comportamento futuro ou indicar culpa ou inocência de um crime? Há alegações, por exemplo, que poderia revelar potenciais 'psicopatias', que os cérebros de homens condenados por crimes brutais mostram significativos padrões anormais.
No atual clima legislativo, onde tem havido tentativas de introduzir detenção preventiva de 'psicopatas' que ainda não tenham condenados por nenhum crime, tais reivindicações precisam ser encaminhadas criticamente. Elas são e serão resistidas pelo judiciário, mas recentes desenvolvimentos sugerem que isso pode ser uma frágil defesa contra um estado crescentemente autoritário.
Mais seriamente, há um crescente interesse militar no desenvolvimento de técnicas que possam inspecionar e possivelmente manipular os processos mentais de potenciais inimigos, ou melhorar o potencial das suas próprias tropas. Não há nada novo acerca de tal interesse. Nos Estados Unidos, isso remonta há pelo menos meio século. Impressionados pelas alegações de que a União Soviética estava desenvolvendo armas de guerra psicológica, a CIA e a Agência de Projetos Avançados de Defesa (Darpa, em inglês) começaram seus próprios programas. Tentativas de experiências iniciais incluíam o abastecimento clandestino de LSD para seus próprios agentes secretos e tentativas de "lavagem cerebral'. Estes foram os precursores dos grupos violentos e white noise (ruído branco) usados pelos ingleses na Irlanda do Norte - até que foi julgado ilegal - e mais recentemente em Abu Ghraib e Guantánamo, onde eles habitam uma linha de fronteira incerta entre o que o governo dos Estados Unidos considera como um nível aceitável de violência e a tortura que ele nega cometer.
Pelos anos 60, Darpa, junto com a marinha dos Estados Unidos, estava financiando quase toda a pesquisa americana em 'inteligência artificial', a fim de desenvolver métodos e tecnologias para o 'campo de batalha automatizado' e o 'soldado inteligente'. Contratos eram concedidos e patentes tiradas sobre técnicas que objetivavam registrar sinais dos cérebros de pessoal inimigo a distância, a fim de 'ler a mente deles'.
Estes esforços floresceram em consequência da assim chamada 'guerra ao terror'. Uma companhia americana alega ter desenvolvido uma técnica chamada 'impressão digital do cérebro', que pode 'determinar a verdade relativa a um crime, atividades terroristas ou treinamento terrorista pela detecção da informação guardada no cérebro'. O stress de ficar sob interrogatório supõe-se que resulta em uma forma de onda específica que eletrodos medindo a flutuação dos sinais elétricos do cérebro podem detectar. Nós podemos ser céticos sobre a validade de tais métodos, mas eles indicam a direção na qual a pesquisa está se encaminhando. A companhia alega que seus procedimentos foram aceitos como evidência no tribunal nos Estados Unidos.
O passo além da leitura dos pensamentos é tentar controlá-los diretamente. Uma nova técnica - estimulação magnética transcranial (TMS, em inglês) - começou a gerar interesse. Ela focaliza um intenso campo magnético em regiões específicas do cérebro, e tem mostrou que afeta pensamentos, percepções e comportamento. Há sugestões que poderia ser usada para controlar comportamento obssessivo-compulsivo, enquanto alguns até levam a sério o cenário contemplado no filme Eternal Sunshine of the Spotless Mind, no qual TMS era usada para apagar memórias indesejadas de um caso amoroso que deu errado. Atualmente só possível se a cabeça do sujeito for colocada dentro de uma máquina adequada, TMS a distância está agora sob ativa investigação militar. Assim também como a tecnologia do chip, que poderia proporcionar próteses implantadas superar déficits sensoriais ou controlar o comportamento, e cujo potencial os comitês de bioética pela Europa têm estado examinando.
Estão tentando rejeitar tudo isso como fantasias tecnológicas e seus proponentes como vendedores de óleo de serpente, mas o fato de que a tecnologia é imperfeita não significa que não será usada. Alguém só tem que pensar de dezenas de milhares de lobotomias realizadas em pacientes esquizofrênicos no século passado. A Inglaterra é um dos exemplos de liderança mundial de uma sociedade de vigilância, observando seus cidadãos através de câmeras de circuito fechado e controlando o comportamento deles com Asbos (ordem de comportamento anti-social) e Ritalin. O potencial para a vigilância dos pensamentos dos cidadãos tem ido muito além das visões de 1984.
A ciência não pode acontecer sem grandes gastos públicos ou privados, mas suas grandes metas são estabelecidas tanto pelo mercado e os militares como pela busca desinteressada pelo conhecimento. É por isso que os neurocientistas têm uma responsabilidade de fazer seus assuntos e seus potenciais tão transparentes quanto possível, e por que as vozes dos cidadãos preocupados deveriam ser ouvidas não 'a favor da corrente' quando as tecnologias já estão completamente formadas, mas 'contra a corrente' enquanto a ciência ainda está em progresso. Nós temos de descobrir maneiras de assegurar que tais vozes sejam ouvidas através da cacofonia dos slogans sobre 'melhores cérebros' - e o poder dos militares e do mercado.
Artigo de: http://observer.guardian.co.uk
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