domingo, 4 de novembro de 2012

A Criação de uma Versão Religiosa da Organização das Nações Unidas

Autor: Carl Teichrib, Forcing Change, Edição 5, Volume 1.
Quando pressupostos errados são empregados, resultados incorretos são garantidamente obtidos.
Dizem que nosso mundo está passando por um "choque de civilizações" [1] e, em alguns aspectos, isto pode ser verdade. [2] A religião, que é vista por muitos como a causa principal da guerra e da instabilidade geral, está situada no meio desta equação. [3].
Neste cenário, a alternativa óbvia ao "choque de religiões", é unir as comunidades religiosas em torno de denominadores comuns, superando assim as divisões que levam a humanidade à guerra. O movimento interfé global atual segue essa abordagem, como também Ken Wilber, do site BeliefNet.com. Postulando essa ideia de unidade religiosa à luz das guerras históricas por religião, Wilber explica:
"Para que a humanidade cesse suas muitas hostilidades e seja unida em uma família, sem suprimir as significativas e importantes diferenças que existem entre nós, então algo como uma abordagem integral parece ser o único caminho. Enquanto isso não acontecer, as religiões continuarão a dividir brutalmente a humanidade, como fizeram em toda a história, e não a unir, como precisam fazer, para serem um auxílio e não um obstáculo, para a existência do amanhã." [4].
Portanto, o que significa estar religiosamente "unido em uma família" e envolvido em algum tipo de "abordagem integral"?
Marcus Braybrooke, presidente do Congresso Mundial das Fés, explora esse tema em seu livro Faith and Interfaith in a Global Age (Fé e Interfé em uma Era Global):
"Minha esperança — embora certamente não seja a esperança de todos no movimento interfé — continua sendo que o diálogo eventualmente trará a convergência ou, pelo menos, que a teologia se tornará uma disciplina inter-religiosa ou uma 'teologia global'." [5].
O teólogo católico alemão Hans Küng descreve uma unificação pan-espiritual similar no prefácio que escreveu para o livro The Meaning of Other Faiths, de Oxtoby: "Após o ecumenismo intraprotestante e intracristão, chegamos irrevogavelmente à terceira dimensão ecumênica, o ecumenismo das religiões do mundo!" [6]. John Davis e Naomi Rice, ambos ligados à Comunhão Copta Internacional, dizem que "o objetivo final é a comunhão das religiões e o aparecimento gradual de uma fé mundial, que em seu conceito mais amplo será capaz de envolver toda a humanidade. [7].
A unificação das religiões, ou a criação de algum tipo de sistema integrado de "Fé Mundial" não é de modo algum um conceito novo. Já em 1893, essa linha de raciocínio foi adotada durante o primeiro Parlamento Mundial das Religiões [8] e, desde então, se tornou um pilar central no movimento interfé moderno.
Por exemplo: em 22 de junho de 2005, a Organização das Nações Unidas realizou um inovador evento inter-religioso de um dia de duração intitulado Conferência Sobre Cooperação Interfé para a Paz. Embora a conferência tenha sido pequena para os padrões da ONU, ela atraiu oficialmente um número significativo de atores internacionais para a agenda interfé global, incluindo representantes de governos de dezesseis países. Alguns dos líderes participantes da ONU, do Banco Mundial, grupos religiosos e organizações não governamentais (ONGs) proeminentes incluíam:
  • Kofi Annan, Secretário-Geral da ONU (foi representado no evento por Robert Orr, assistente do secretário-geral no Planejamento de Políticas).
  • Jean Ping, presidente da Assembleia-Geral da ONU.
  • Munir Akram, presidente do Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU.
  • Koichiro Matsuura, diretor-general da UNESCO (convidado, não pôde comparecer pessoalmente, mas enviou uma mensagem especial de solidariedade).
  • Sarah Titchen, especialista em Programas Culturais da UNESCO; trabalha em Nova York.
  • Ramu Damodaran, chefe da Divisão do Serviço de Comunicação com a Sociedade Civil, Departamento de Informações Públicas da ONU.
  • Adnan Amin, diretor de Coordenação de Políticas e Relações Inter-Agências, Programa do Meio Ambiente da ONU.
  • Katherine Marshall, diretora e assessora do presidente do Banco Mundial.
  • Pauline Muchina, representante do Conselho Consultivo Anglicano (levou uma mensagem do Arcebispo de Canterbury, o chefe da Igreja Anglicana).
  • Andrea Bartoli, diretora do Centro para a Solução de Conflitos Internacionais, na Universidade de Colúmbia e representante da Santa Sé.
  • Laurence Bropleh, representante permanente junto à ONU, Comissão das Igrejas Sobre as Relações Internacionais, do Conselho Mundial de Igrejas.
  • Bani Dugal, representante da Comunidade Bahá’í Internacional na ONU.
  • William Vendley, secretário-geral da Conferência Mundial das Religiões Pela Paz.
  • Hiro Sakurai, presidente do Comitê das ONGs Religiosas, na ONU. [9].
Por que listar os atores principais nesse evento interfé da ONU? Por causa da abrangência da propagação que essa lista representa — o movimento interfé faz a ponte entre três grupos distintos: governos, agências da ONU e as organizações não governamentais (ONGs).
O propósito desta conferência, que era visível em seu título, era fazer avançar a agenda interfé/paz mundial para um nível mais substancial. Por sua natureza, esse é um movimento político. Como Jean Ping, presidente da Assembleia-Geral da ONU explicou:
"Se as religiões contribuem para a paz no mundo, temos também de reconhecer que elas foram usadas para criar divisão e alimentar as hostilidades. O fanatismo e a adesão à ideologias exclusivistas, tanto religiosas quanto seculares, desafiam há vários séculos as comunidades religiosas, os governos e as relações internacionais. É importante que ao construirmos nossa civilização, avancemos a cooperação interfé entre os governos, dentro da sociedade civil e do sistema das Nações Unidas... A busca pela paz e pela justiça e a necessidade de vencer a violência, vincula juntos as religiões, os governos e a ONU." [10].

Reportando sobre o evento, a Comunidade Bahá'í Internacional acerta o alvo em termos da ideia maior: "A chave para a harmonia interfé e para a cooperação é focarmos na unicidade essencial de todas as religiões." [11]. Por quê? Por que a busca da "paz mundial" irrevogavelmente vincula a política e a religião em uma nova estrutura global.
Sobre essa busca interfé-política por unidade global, o embaixador Munir Akram, presidente do Conselho Econômico e Social da ONU disse aos participantes: "A fé é também um instrumento poderoso para a mobilização política e social — para alcançar objetivos coletivos." [12].
Considerando tudo isto no contexto, um quadro perturbador aparece: a criação de uma "Iniciativa Religiosa" no estilo da Organização das Nações Unidas.
Isto foi ainda mais enfatizado na conclusão da Conferência Sobre Cooperação Interfé para a Paz, quando foi anunciada a criação de uma nova organização ligada à ONU: o Fórum Tripartite Sobre Cooperação Interfé para a Paz.
Formada como uma trinca, a organização é dirigida por um grupo tripartite composto por laços governamentais nacionais, o sistema da ONU e ONGs selecionadas. O papel do Fórum Tripartite é aproveitar o curso de eventos interfé atual e ajudar a solidificar essa agenda inter-religiosa dentro da comunidade internacional.
Falando no primeiro aniversário do Fórum Tripartite em 23 de março de 2008, Hilário G. Davide Jr., representante permanente das Filipinas, analisou a abrangência e a importância desse trabalho:
"Em um sentido muito real, celebramos o primeiro aniversário de nascimento de uma criança singular, um presente especial ao mundo: uma criança que nasceu como resultado do amor universal pela justiça e do amor pela paz, como fruto do diálogo global interfé, intercultural e intercivilizacional, da compreensão e da cooperação..."
"... Novos desafios para a paz, o desenvolvimento e a promoção da dignidade humana parecem eludir muitos modos tradicionais de tratar os problemas. O Fórum Tripartite representa uma das abordagens criativas para lidar com esses desafios dos tempos modernos, tratando esses desafios de uma forma multifacetada que busca mobilizar o envolvimento de todos os participantes, em particular as comunidades religiosas."
"A Conferência Sobre Cooperação Interfé para a Paz, realizada em Nova York em 22 de junho de 2005 deu à luz o Fórum Tripartite. Neste ponto, preciso reconhecer com profunda gratidão os esforços coletivos realizados pelo grupo original de governos que convocou a conferência e apoiou o desenvolvimento da nossa iniciativa: Argentina, Bangladesh, Equador, Gâmbia, Alemanha, Indonésia, Irã, Casaquistão, Malásia, Marrocos, Paquistão, Filipinas, Senegal, Tailândia e Tunísia, em cooperação com três organismos da ONU: UNESCO, UNDESA e o Banco Mundial, bem como 110 ONGs religiosas registradas na ONU."
"O diálogo interfé ganhou um crescente interesse em todo o mundo e é reconhecido pelo Grupo dos 77, pela China, pelo Movimento Não Alinhado, pelo Encontro Ásia-Europa e pelo Fórum Regional ASEAN. Atualmente, ele é o projeto mais importante da UNESCO para o biênio 2006-2007; ele foi notado no Encontro de Cúpula Mundial de 2005; e serviu como uma das premissas na criação do Conselho dos Direitos Humanos. Mais importante ainda, ele deu ímpeto para a adoção unânime pela Assembléia-Geral da ONU em sua sexagésima segunda sessão da resolução intitulada "Promoção do Diálogo Inter-Religioso e Intercultural, Compreensão e Cooperação", apresentada pelo Paquistão e pelas Filipinas e copatrocinada por mais de 50 países.
"Várias agências da ONU estão em cooperação com comunidades religiosas no cumprimento de suas incumbências — UNESCO, UNICEF, UNFPA, UNEP, Banco Mundial, entre outras."
"A sociedade civil tem sido ativa na promoção do diálogo e cooperação interfés, notavelmente a Conferência Mundial Sobre as Religiões pela Paz, o Templo da Compreensão, a Iniciativa das Religiões Unidas, e diversas outras organizações importantes."
"... Gostaria de concluir convidando todos a considerarem o apoio às atividades do Fórum Tripartite, considerando uma das conclusões da Conferência de Alto Nível Sobre a Cooperação Interfé para a Paz, que 'o diálogo e a cooperação interfés para a paz não são mais um opção, mas uma necessidade essencial'." [13] [Itálico no original].
Em 21 de setembro de 2007, o Fórum Tripartite realizou uma segunda rodada de seus encontros de alto nível sobre a agenda interfé global. Trinta e três representantes oficiais de governos estiveram presentes, juntamente com líderes das principais organizações inter-religiosas, como a Iniciativa das Religiões Unidas. Comentando sobre essa conferência, o Dr. John Grayzel, da Cadeira Bahá'í para a Paz Mundial, uma unidade acadêmica da Universidade de Maryland, disse aos participantes: "Se as organizações religiosas do mundo se unissem, poderiam iniciar um novo grupo de resposta global de alerta imediato para se apresentar sempre que houver alguma disputa, conflito ou mal-entendido. Esse grupo poderia trazer à consciência de todos, independente de quaisquer discórdias e aparentes divergências de interesses, um nível de reflexão que reconhece a origem comum da humanidade e, fundamentalmente, uma fé comum." [14].
Alberto Rômulo, Secretário das Relações Exteriores das Filipinas e presidente do fórum, de forma bastante emocional, colocou a carga da culpa pelas guerras sobre as religiões, enfatizando a motivação para a unidade religiosa. "Algumas das atrocidades, violências e problemas que o mundo enfrenta podem ser atribuídos aos proponentes de variadas orientações religiosas." [15].
Portanto, é a criação de uma organização congênere à ONU, porém "voltada para as iniciativas religiosas" um exagero? Absolutamente não. A ONU e a comunidade internacional já começaram a pavimentar o caminho para levar o mundo a aceitar a criação desse tipo de organização.
Considere os seguintes acontecimentos:
  • Cada um dos sucessivos Parlamento das Religiões Mundiais (1993, 1999 e 2004) empurrou a agenda interfé mais para o centro dos holofotes da sociedade. Durante o Parlamento de 2004, foram feitos compromissos de impactar a tomada de decisões políticas e globais por meio de uma influência unificada do lóbi interfé. Na verdade, o Parlamento ganhou tanto em termos de impacto real que as grandes cidades de todo o mundo agora disputam umas com as outras para sediarem essa "olimpíada" prestigiosa das religiões. [16].
  • A Iniciativa das Religiões Unidas — uma organização interfé internacional que trabalha no nível de raiz popular e dentro da comunidade internacional — foi modelada na mesma linha que a ONU e com aprovação desta. [17]. Hoje, a Iniciativa exerce um importante papel em fazer avançar os conceitos políticos-interfés globais.
  • Durante o Encontro de Cúpula da Paz Mundial no Milênio, promovido pela ONU, centenas de líderes religiosos de todo o mundo se reuniram na ONU na esperança de encontrar uma resposta interfé para o problema da "paz mundial". O resultado desse encontro: criação do Conselho Mundial dos Líderes Religiosos. De acordo com a Carta de Constituição desse Conselho, o objetivo dele é "servir como um modelo e guia para a criação de uma comunidade de religiões mundiais". O Conselho dos Líderes Religiosos também atua como um recurso espiritual para ajudar a ONU a criar uma comunidade humana unida e "uma sociedade mundial justa". [18].
Lembre-se que uma grande parte do ímpeto para o trabalho político-interfé deriva da ideia que a religião e a guerra estão profundamente entrelaçados — o que explica o contínuo apelo pela "paz mundial" e por "uma sociedade mundial justa", que são tão frequentemente ouvidos nos eventos interfé.
Descrevendo essa convergência espiritual/política à luz do laço religião-guerra-interfé, Frank Kaufmann, diretor-executivo da Federação Inter-Religiosa para a Paz Mundial (uma organização fundada pelo reverendo Sun Myung Moon), sugeriu em 1998 a criação de um corpo global capacitado "que se assente acima das religiões em um nível internacional ou inter-religioso." [19].
Kaufmann explicou:
".... esta organização fará as comunidades religiosas operarem de tal forma que elas irão expor, censurar e exercer pressão sobre as religiões que estejam atuando de forma contrária à natureza cooperativa do organismo."
A criação de um organismo internacional político-religioso coercitivo parece ser uma abordagem benevolente para a paz mundial?
Mesmo que se olhe superficialmente, o aparecimento de uma abordagem centralista para a "ordem religiosa" não pode deixar de ser observado. Não é possível deixar de observar que uma "Comunidade Religiosa" global, centralizada e com envolvimentos políticos tem o potencial real de se tornar muito mais do que apenas uma grande burocracia — ela tem as sementes para se tornar uma nova forma de coletivismo religioso: um "soviete" internacional baseado na religião.

Pressupostos Incorretos, Paz Imperfeita

Quando pressupostos errados são empregados, resultados incorretos são garantidamente obtidos. Considere os seguintes pressupostos errôneos na teia de aranha interfé-política:
1. Que a religião é fundamentalmente culpada pelas piores atrocidades e conflitos na história humana.
Como já demonstrado no ensaio "Sonhos Utópicos Sanguinários: A Nova Era, o Comunismo e o Nazismo", essa suposição é totalmente enganosa e factualmente incorreta.
Embora as religiões hoje e historicamente tenham sido culpadas (o Islã é um exemplo tanto nos contextos moderno e antigo [20]), a religião não foi a causa principal em todas as guerra e conflitos, nem mesmo nos casos mais extraordinários do século 20. Lembre-se que as maiores carnificinas e derramamento de sangue nos cem últimos anos ocorreram sob os regimes comunistas de Lenin, Stalin, Mao Tsé-tung e Pol Pot (que matou de 25% a 33% da população de seu próprio país, o Cambodja) e por meio das ações horrendas do nacional-socialista Adolf Hitler.
Abraçando este circuito guerra-religião-interfé-paz, a busca pela harmonia mundial está edificando sobre um terreno movediço.
2. Um formato de governança global, que conecte o movimento interfé à comunidade política internacional, alcançará a paz mundial.
Este pressuposto tem duas formas: Um regime de "gestão" político/religioso explícito, conforme sugerido por Kaufmann, ou um sistema organizado e internacional de pressão que faça lóbi para exigir mudanças de política nos níveis nacional, regional e global. De ambas as formas, é a infusão de poder de uma forma centralista — e os sistemas políticos centralistas historicamente foram atrozes no que se refere à busca da paz. [21].
Independente se esse sistema de governança for apresentado como "democracia global" e o lado religioso como uma nova "ética global", o resultado é que uma configuração híbrida política e religiosa entrará em ação. Misture esses dois e você terá uma iniciativa política e internacional religiosa, a legitimação e capacitação da governança global e a imposição da paz em nome da tolerância.
Paz imposta não é paz de forma alguma.
3. Que todas as religiões são igualmente válidas e contêm as mesmas verdades essenciais e que a espiritualidade pode operar sob um conjunto padrão de normas planetárias.
O pressuposto acima está na essência do movimento interfé maior. Todavia, ele contraria a Antropologia, a Sociologia, a História e a Teologia. Os sistemas de crenças do Hinduísmo e do Cristianismo (por exemplo) estão fundamentalmente em antagonismo, como também as posições teológicas do Islã em comparação com o Budismo, o Animismo versus o Judaísmo, etc. Além disso, o conceito que todas as religiões são "igualmente válidas" é inconsistente pela lógica.
Alguns anos atrás, ao sair em uma pesquisa de campo para a coleta de fatos, compareci a um evento interfé global na Flórida. Durante um intervalo no período da tarde, a discussão sobre "a igualdade e validade" das religiões subitamente chegou a um impasse quando um dos participantes tentou aplicar a lógica ao princípio do movimento interfé.
"— O que faremos com os cultos que realizam sacrifícios humanos e com o satanismo?", ele perguntou.
Toda a discussão em volta da mesa do café se transformou em um silêncio. Sem dúvida, cada pessoa ali compreendeu intuitivamente que a posição interfé de igualdade e validade das religiões tinha se chocado contra um muro de tijolos.
Isto não deveria ter sido surpresa; afinal, existem muitos sistemas religiosos que são socialmente repulsivos — até mesmo em nossa "era dourada" de tolerância. Por exemplo, o satanismo, conforme apresentado por Anton LaVey, fundador da Igreja de Satanás, prega a religião da total satisfação dos desejos e a busca dos prazeres.
A Bíblia Satânica, de autoria de LaVey, diz orgulhosamente: "Sou meu próprio redentor." [22]. Além disso, esse tipo de egoteísmo deixa pouco espaço para a compaixão social. Como diz a Bíblia Satânica:
"Bem-aventurados os fortes, pois possuirão a Terra; amaldiçoados sejam os fracos, pois herdarão a canga! Bem-aventurados os poderosos, pois serão reverenciados entre os homens; amaldiçoados os frágeis, pois serão erradicados!... Bem-aventurados aqueles que têm punhos de aço, pois os mais fracos fugirão diante deles; amaldiçoados os pobres de espírito, pois serão cuspidos!... Bem-aventurados aqueles que creem naquilo que é melhor para eles... Amaldiçoados sejam os 'cordeiros de Deus', pois sangrarão até se tornarem mais alvos do que a neve!" [23; tradução nossa].
Compare isto com o cristianismo bíblico, que ensina o amor ao próximo e aos inimigos, [24] e o cuidado com os doentes e fracos [25], e vemos que as diferenças não poderiam ser mais vívidas. Além disso, ao contrário da auto-redenção, o Cristianismo reconhece a natureza pecaminosa do homem [26] e que a salvação somente pode ser obtida por meio da obra consumada de Jesus Cristo. [27].
As diferenças entre essas duas religiões não poderiam ser mais chocantes. Existem diferenças fundamentais não somente entre a "adoração a si mesmo" e o Cristianismo, mas entre todas as religiões. Todavia, durante a Conferência Interfé de Paz promovida pela ONU em 2005, o presidente do ECOSOC declarou claramente: "Os dogmas básicos de todas as fés e culturas são fundamentalmente similares..." [28].
Não somente este é um pressuposto incorreto, mas é uma afirmação que está baseada no conceito de governança global para fins políticos. Como citado anteriormente por Munir Akram, presidente do ECOSOC: "A fé é também um poderoso instrumento para a mobilização política e social — para alcançar objetivos coletivos." [29].
Tomados em conjunto, esses ideais políticos e religiosos errôneos somente podem levar a uma conclusão errônea. A paz mundial não poderá ser criada com base na centralização política, que por sua própria natureza requer a acumulação, retenção e uso do poder — uma antítese da paz e das liberdades e que pode ser comprovada historicamente.
Tampouco uma plataforma das Fés Mundiais/Organização das Religiões Unidas pode ser a resposta, a não ser que ela também se torne eventualmente coercitiva e degradante.
A mão do homem não pode alcançar a paz mundial. Este fato não dá licença para a beligerância ou para a total falta de esperança, mas simplesmente aponta para a realidade da nossa situação humana e dos perigos da imposição dos sonhos utópicos.
Portanto, o que acontecerá se uma estrutura política/religiosa for formada, colocando em cena um sistema interfé reconhecido e imposto internacionalmente?
Contemplar esse cenário me faz lembrar da antiga máxima comunista: "Paz é a destruição de toda a oposição."

Notas Finais

1. Samuel P. Huntington, The Clash of Civilizations: Remaking of World Order (Touchstone/Simon & Schuster, 1996/97). Huntington propôs que os conflitos que surgiram no mundo após a Guerra Fria foram alimentados por conceitos culturais e religiosos. Em 1928, Leonard Woolf escreveu um pequeno volume intitulado Imperialism and Civilization, en que também delineia a ideia de um "choque de civilizações". Woolf aponta o imperialismo como o principal ator nesse choque: "Embora os conflitos raciais e religiosos pareçam superficialmente serem fatores vitais, na realidade apenas disfarçam o problema muito mais fundamental do choque de civilizações. Eles não são as causas, porém sintomas de uma doença que está afligindo a humanidade em várias partes do mundo. Não é uma questão racial, religiosa ou de nacionalismo, mas de colisão e desajustes de diferentes civilizações sob o impulso do imperialismo.” (pág. 22).
2. O livro de Tony Blankley, The West’s Last Chance: Will We Win the Clash of Civilization? (Regnery, 2005), delineia o choque entre os ideais do Islã e os do Ocidente. Outros livros, como o de Dave Hunt, Judgment Day: Islam, Israel and the Nations (Berean Call, 2005), também detalha a ascensão do Islã e sua abordagem antagônica ao Cristianismo, a Israel e aos conceitos ocidentais de liberdade.
3. Veja no artigo "Sonhos Utópicos Sanguinários" uma análise do argumento cíclico religião-guerra.
4. Ken Wilber, "Why Do Religions Teach Love and Yet Cause So Much War”, http://www.beliefnet.com/story/147/story_14762.html. Acessado em 17 de novembro de 2005.
5. Marcus Braybrooke, Faith and Interfaith in a Global Age (CoNexus, 1998), págs. 15-16.
6. Hans Küng, Prefácio para o livro de Willard G. Oxtoby, The Meaning of Other Faiths (The Westminster Press, 1983), pág. 10.
7.John Davis and Naomi Rice, Messiah and the Second Coming (Coptic Press, 1982), pág. 111.
8. The Dawn of Religious Pluralism: Voices from the World’s Parliament of Religions, 1893 (Open Court, 1993).
9. Conferência da ONU Sobre Cooperação Interfé para a Paz, em 22 de junho de 2005.
10. Declaração de Jean Ping, presidente da sessão da Assembleia-Geral da ONU na Conferência Sobre Cooperação Interfé para a Paz, em 22 de junho de 2005. Discurso arquivado por este autor.
11. Comunidade Bahá’í Internacional, "At the UN, governments and religious NGOs convene a peace conference", One Country, abril-junho de 2005, pág. 14.
12. Embaixador Munir Akram, presidente do Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU, falando na Conferência da ONU Sobre Cooperação Interfé para a Paz, 22 de junho de 2005; discurso nos arquivos deste autor.
13. Mensagem de Hilário G. Davide Jr. representante permanente das Filipinas no primeiro aniversário do Fórum Tripartite Sobre Cooperação Interfé para a Paz, 23 de março de 2007, http://www.tripartiteinterfaithforum.org.
14. "Fórum da ONU vê o diálogo interfé como essencial para a paz", Bahai World News Service, http://www.bahaiworldnews.org/story/484.
15. Idem.
16. Carl Teichrib, "Uma Análise da Agenda Interfé Global”. Veja também "Re-Creating Eden", em http//www.gracesite.net/Articles.htm.
17. Veja Carl Teichrib, "Blending of the Gods: The United Religions Initiative Global Charter Signing" e outros artigos sobre o movimento interfé global em várias edições de Hope For The World Update. Veja também Gary H. Kah, The New World Religion: The Spiritual Roots of Global Government (Hope International Publishing, 1999), e The August Review, Volume 8, Edição 5, "Global Religion for Global Governance", em http://www.augustreview.com.
18. Conselho Mundial dos Líderes Religiosos, WCRL Charter, Capítulo 2, http://www.millenniumpeacesummit.com/chapter2.html. (Acessado em 21 de novembro de 2005).
19. Frank Kaufmann (Federação Inter-Religiosa para a Paz Mundial), "Religious Wars and World Peace", um discurso feito na Conferência Internacional Coalizão para a Liberdade Religiosa e o Novo Milênio, Washington DC, 17-19 de abril de 1998. O discurso de Kaufmann foi transcrito e pode ser lido em http://www.religiousfreedom.com (selecione Conference Papers, depois Kaufmann).
20. Veja Dave Hunt, Judgement Day: Islam, Israel and the Nations (The Berean Call, 2005) e Dore Gold, Hatred’s Kingdom (Regnery Publishing, 2003).
21. Veja R. J. Rummel, Death By Government (Transaction Publishers, 1994).
22. Anton Szandor LaVey, The Satanic Bible (Avon, 1969), pág. 33.
23. Idem, pág. 34. 24. Mateus 5:43-44 e Mateus 19:19. 25. Mateus 25:31-40. 26. Romanos 3:23. 27. Veja João 14:6, Romanos 3:21-26, Atos 4:8-13, etc.
28. Embaixador Munir Akram, presidente do ECOSOC, falando na Conferência da ONU Sobre Cooperação Interfé, em 22 de junho de 2005; discurso nos arquivos deste autor.
29. Idem.

Autor: Carl Teichrib, artigo original em http://www.forcingchange.org, Edição 5, Volume 1.
Revisão: http://www.TextoExato.com
A Espada do Espírito: http://www.espada.eti.br/interfe.asp

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